segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Resenha do filme francês: "Amor"

de Eliane Accioly
(Amour) Direção: Michael Haneke.
Elenco: Jean-Louis Trintignant, Emanuelle Riva, Isabelle Huppert, Alexandre Tharaud e Willian Shimell.

Um pequeno derrame pode mudar uma vida, vidas, assim como revelar a real precariedade e fragilidade do ser humano, em cada um de nós ao nascimento, mas que teimamos em negar, nos sentindo poderosos. E nada poderia ser pior que a ilusão do poder. Temos a precariedade de ser humano, cada um de nós, reconheçamos ou não. E assim, seria importante reconhecer a precariedade de nossos jeitos de viver, da vida em comum, da vida em família. Terrificante, não é?

O filme é primoroso. Sem uma pitada falsa de açucar. Impressionante imaginar que este filme tenha sido criado, e de que se encontre  à disposição de cada um de nós que queira e se disponha a assistí-lo. O diretor é uma pessoa extremamente sensível e verdadeira, um artista, e entre os atores, se distingue acima o par: Trintignante X Riva.

Casal de octogenários que vivia harmonicamente o curso de suas vidas, ou da vida em comum muito bem plantada pelos dois. Se amaram desde sempre, verdadeiros em sua força de vida, chegando à velhice cercados daqueles que frequentaram e ajudaram a crescer, assim como pelas coisas que adquiram durante a vida livros, quadros, e outros objetos desde artísticos, à louça de cozinha.  Faziam a própria comida e nas refeições tomavam vinho, como parte inclusa do prazer de cozinhar e compartilhar. Ambos professores de música, próximos de pessoas que os  respeitavam e admiravam. Uma filha, um genro e netos mais distantes, cada qual com sua vida, até porque o casal de velhos se bastava. O que não significa ser bom, apenas era assim. Até o incidente que os atravessa e os devassa.

Anne não aceita seu estado, tendente a piorar, segundo os médicos, e constatado pelo dia a dia do casal. Ele se fecha no pedido da mulher, que não a deixe parar em hospitais ou em asilos! Cuidadoras são dispensadas, a filha não é escutada.
Para não invadir o filme forte e delicado, vou contar da pomba sem desconfiômetro, que invade o apartamento dos velhos senhores, costumeiramente. A pomba passeia por ali, como se o espaço fosse dela. O território de uma pomba, é assim como o de um cão. O território é deles, e os que ali se encontram, pertencem aos donos do território. No caso não é um cão, mas uma pomba.
Vale a pena ver o filme, e apreciar o que ele revela do real e do simbólico. Paradoxos e dimensões humanas, de cada um de nós.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Encontros


Amós Oz, escritor israelense de quem tanto gosto e sigo nas aventuras dos livros que vou encontrando. Que bom sermos contemporâneos, neste mundo estranho e contraditório em que vivemos. Acabo de ler “de amor e trevas”, livro com lembranças autobiográficas. Nele, aparece como um menino cujos pais falavam várias línguas. Com o filho só em hebraico. Quando queriam falar entre eles se comunicavam em russo, em polonês: “O menino está escutando”, diziam.  Uma vez o avô paterno falava exatamente com Amós, contando histórias da família e outras. E a avó passando por ali escutou, e dirigindo-se ao avô: “Fala em russo, o menino está ouvindo”.

“Oz” em hebraico significa “coragem”.  O escritor adotou este pseudônimo/nome após a morte de sua mãe, quando tinha 12 anos.  O livro “de amor e trevas” tem 617 páginas. Os pais foram presenças muito fortes para Amós, embora em muitos momentos, presenças atormentadas e atormentadoras. Ambos intelectuais e originários de famílias da Diáspora. Amós nasceu em Jerusalém, em 1939, momento que esta cidade pertencia aos ingleses.

Conviveu em sua infância e adolescência com líderes como Bem Gurion e Menachem Begin, e com muitos escritores e acadêmicos, pessoas de uma época crucial na qual Israel que se constituía, enquanto país.  Entre os escritores que Amós Oz cita, e diz ser ultrapassado como muitos outros escritores/mitos da época de seus pais, encontra-se Agnon. Este recebeu o prêmio Nobel na década de 60. Fiquei surpresa ao encontrar em minha biblioteca as “Novelas Jerusalém”, de Agnon. Editora Perspectiva, 1967. Comprei este livro no “Sebo Bagdá”, que fechou suas portas em 2011. Quando fecha um estabelecimento que frequentei durante anos sinto nostalgia em um primeiro momento, e me acostumo rápido, a vida continua.

Entre fins do século XIX, a primeira guerra (1914) e a segunda guerra (1939) países acabaram e outros surgiram, Israel, por exemplo. E em Israel quantos povos, momentos históricos, muitos países.  E em cada um de nós quantas histórias, quantas vidas vividas nesta vida. É do que trata “de amor e trevas”, livro de Amoz Oz.

domingo, 13 de janeiro de 2013

para minha tribo daqui do blog





 
 
 
 
 





1.

uma fonte une poetas,
alimenta moinhos,
movimenta monjolos,
e se der sorte, traz à luz

um poema de vento
ou de água 
ou de fogo, essa fonte,
ferro incandenscente de marcar cavalos,
seu nome: desassossego

2.
cavalo marcado em brasa,
inserido à força na manada ganha rédeas,
a não ser que se rebele, corcoveie, fuja
(para onde?)


marcado pelo desassossego,
o poeta,
rebelde de nascença, inconformado,
nasce sentindo-se à parte,
mas queira ou não, mesmo sem pertencer
é parte do rebanho


porque ser poeta não é ser louco,
nem tampouco ermitão,
o poeta, ao mesmo tempo,
estrangeiro e gregário,
quer compartilhar, quer leitor (es)


se o poeta, ser estranho
no seio do rebanho,
não pertence,

solitário lobo uivando
nas estepes da poesia.

3.

desaparece a inspiração,
período da entressafra,
quando parece, nada mais irá brotar

ainda assim me recuso a esquecer a sina,
ser poeta, minha benção,
minha maldição.

e eu que tanto brigo,
na poesia sou à baila,
a mercê das mercês,
que pelas bençãos, existem.

4.

se hoje é domingo, e amanhã será segunda,
como se domingo fosse a primeira... e seria?
não sendo assim linear nem há primeiras,
e hoje domingo, tempo de devassidão e embriaguez,
eras de fernando pessoa e guimarães rosa


e embora hoje seja eu escuridão,
me agarro à clarice,
raio da lua perdida
nos vapores da cidade


e então, me afirmo lunar,
nesta invernada lispector do verão


5.

sendo lispector e clarisse,
sou pessoa e guimarães,
sou ninguém